[Resenha] D&D: Honra entre Rebeldes - Um filme de super-heróis para um jogo de super-heróis




Após o sucesso estrondoso que a 5e alcançou nos últimos anos, e na esteira do fiasco em que a Wizards/Hasbro se meteu com toda a treta envolvendo a Open Game License (OGL), estreou o mais novo filme baseado na marca Dungeons and Dragons.

Os dois filmes anteriores não gozaram do mesmo prestígio que o atual vem recebendo, o que em si já é um passo à frente. Como sempre, a Hasbro apostou em grandes nomes do cinema, como o astro Chris Pine, que protagoniza o filme como o Tony Stark da fantasia medieval, recrutando os Vingadores da Costa da Espada e soltando as principais piadas do filme.

E é justamente o carisma dos atores, aliado a uma aplicação bem-sucedida da fórmula Marvel, e uma excelente direção da dupla Jonathan Goldstein e John Francis Daley quem sustentam o longa-metragem. O filme diverte, tem momentos de tensão, diálogos engraçados e efeitos especiais competentes.

O roteiro soube utilizar bem os quase 50 anos de história da marca, e este, é possivelmente o produto com a maior autorreferência a D&D já produzido. Desde monstros clássicos, locações icônicas, NPCs (citados ou aparecidos) e organizações de Forgotten Realms, além das classes de personagens e poderes. Tudo jogado na tela para o deleite dos fãs, sem forçar a barra, mas nada crucial para entender a história do filme.

A trama é bastante simples: um grupo de aventureiros se separa após sofrer um revés. E para se vingar de uma pessoa poderosa precisam elaborar um plano de infiltração e roubo. Um heist movie.

Do início ao fim, a dupla de diretores consegue manter um ritmo da trama sem ficar chato ou longo demais. Tudo funciona muito bem, como feijão com arroz. Nada inovador, só um ótimo filme de sessão da tarde. Os diretores já são conhecidos por serem bons em dirigir comédias, e acertam o tom também em Dungeons and Dragons, inclusive são creditados também como roteiristas, então muito do resultado positivo se deve a eles.

O desenvolvimento da trama se dá em torno da trupe dos personagens principais. A relação entre o casal de amigos interpretados por Chris Pine e Michelle Rodriguez é excelente, com cenas hilárias e clássicas do “ladrão e seu amigo bárbaro”. A relação de Chris Pine com o paladino também é muito engraçada, aproveitando-se muito bem do clichê do paladino pedante e moralista e sua relação com o ladrão do grupo. Hugh Grant está sensacional como o vilão sem escrúpulos e traiçoeiro, e seu carisma equivale ao de Chris Pine. O único ponto negativo é a vilã dos magos vermelhos, que é bem rasa e só serve mesmo para garantir uma batalha épica ao final do filme, com direito à cena do Hulk (sim, a Hasbro tem um Hulk para chamar de seu). Mesmo assim ela é apenas um extra e uma ponta para uma possível continuação, e serve muito mais como ferramenta de roteiro para desenvolver os personagens de aventureiros para heróis de Baldur’s Gate.

Algumas cenas são bastante interessantes e brincam com tropos do jogo e do gênero. No cemitério, os aventureiros precisam conversar com mortos usando o clássico feitiço que já “estragou” muita trama de mestre despreparado. A cena, em um cemitério, em um filme tradicional de fantasia seria mais séria ou mesmo horripilante, mas os diretores souberam transformá-la em um dos momentos mais hilários do filme, sem negar o seu caráter de horror (tanto que é retomada no pós-créditos). Esse foi um momento de altas risadas na sala de cinema.

No combate final temos um duelo mágico até que competente. A arena é uma adição muito bem-vinda, utilizada de maneira que serve à trama e ao mesmo tempo é a grande homenagem ao D&D clássico, com seus monstros, armadilhas e caça ao tesouro, além do labirinto que é uma dungeon clássica. Mas a cena que melhor representa o espírito do filme (de ladrões) é o plano e a execução da invasão através de um portal mágico muito bem posicionado em um retrato.

Este é um filme que pode agradar ao público geral, mas não deixa a desejar nas referências ao bom e velho RPG das nossas mesas. Claro, o clima é de alta magia (estamos falando de Forgotten Realms, com magia no dia a dia das pessoas), mas ainda assim o roteiro sabe utilizar essa ferramenta a serviço da narrativa, fazendo piadas do tipo: “não dá pra resolver tudo com magia”. Também temos um desenvolvimento de uma jornada do herói como numa história padrão, utilizando conceitos e ferramentas narrativas muito próximas do que tem sido utilizado pelos filmes da Marvel, mas sem errar.

Dungeons and Dragons: Honra entre Rebeldes é um filme de heróis numa roupagem de fantasia medieval, com bastante aventura, ação e uma boa dose de comédia. Apesar de expressar mais o clima de jogos mais modernos como a 5e, com seus arcos narrativos, desenvolvimentos de personagens, heroísmo, etc., não fica devendo nas referências a clássicos do RPG.

O filme não atingiu o sucesso de público esperado e tem sido considerado um fracasso de bilheteria, mas em termos de qualidade supera em muito seus predecessores. Agora resta esperar para ver se mesmo com o fracasso comercial a Hasbro seguirá investindo em novas produções cinematográficas para a franquia, e se conseguirá manter o padrão de qualidade alcançado neste longa-metragem.

Comentários

  1. Confesso que ainda não assisti. Será que é legal pra apresentar o jogo a crianças e adolescentes?

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    1. Acredito que sim. Tenho visto alguns comentários sobre ter interesse em jogar após ver o filme. Não acho que seja a melhor representação em cinema de uma mesa de rpg, mas tem boas referências e conversa bem com a geração mais jovem.

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